O sistema de graduação com faixas no Karate, com kyu e dan, tem cerca de cem anos. Foi “emprestado” do método que era utilizado por Jigoro Kano, fundador do Judo, da mesma forma que ocorreu com o nosso uniforme, o dogi. O Karate precisava ser sistematizado e formalizado para ser aceito no Japão, além das necessidades didáticas da expansão do ensino.
A adoção dessa forma de graduação teve vários fatores positivos do ponto de vista didático, possibilitando estruturar o conteúdo e conceitos a serem abordados em cada faixa, coordenar os treinos de acordo com o nível do grupo, diferenciar quem tem mais experiência e pode ajudar os menos graduados, oferecer aos alunos objetivos mais “palpáveis” de crescimento, entre outros. A faixa, entretanto, é uma ferramenta e não define em si a prática do Karate, que vai muito além de nomenclaturas e títulos.
Mais do que se apegar às faixas e cores, o praticante de Karate deve ter a mentalidade de desbravar a arte com determinação. Os grandes mestres precursores do Karate como Itosu, Azato, Higaonna, Matsumora e Sakugawa não tinham faixa e dans, mas tinham em comum o espírito de manter o Karate vivo pela prática e contribuir para o desenvolvimento da nossa arte. Eles entendiam que a essência de ser um verdadeiro karateka está nas atitudes.
Agora que temos as faixas como uma espécie de símbolo da nossa evolução, é fácil perder o foco e achar que basta passar no exame e treinar de vez em quando que está tudo bem. Mas a verdade não é essa. Precisamos lembrar dos exemplos dos mestres do passado e manter em nossos corações que Karate se faz com a nossa dedicação. E isso é especialmente importante quando falamos do símbolo que é a faixa-preta. Não é apenas sobre usá-la na cintura. O faixa-preta precisa estar imbuído do mesmo espírito desses grandes mestres, procurando compreender que o legado do Karate é uma chama que precisa ser protegida e alimentada com empenho.
A partir do momento que você se dispõe a usar uma faixa-preta, carregando o nome de uma escola, você assume uma responsabilidade maior do que a dos demais estudantes. Você passa a representar, para a sociedade e seus colegas, o modelo de um karateka avançado dentro de sua linhagem. Então, a forma como você age ou deixa de agir dentro e fora do dojo tem um peso muito maior. Você é um exemplo, estará na linha de frente da sua organização.
Alguém que se propõe a ser faixa-preta não poder ser desleixado, descomprometido, preguiçoso, violento, desinteressado ou desonesto. Não pode faltar com a palavra. Todos os olhos estão em você. Você precisa frequentar o dojo com empenho redobrado e lembrar que o mérito da conquista da faixa-preta não termina no exame de faixa, mas perdura na forma como o praticante se comporta após obtê-la. Não é sobre ego ou sobre ser melhor que os outros, mas sobre ter determinação e a mente aberta para continuar trilhando seu caminho em busca de aprimoramento.
Na Associação Karate-Do Tanaka, nós acreditamos que só pode ser tratado como faixa-preta quem segue praticando e se desenvolvendo. Se alguém abandonou os treinos, seja qual for o motivo, e ficou anos sem treinar, ele “foi” faixa-preta e karateka, não “é”. Obviamente, esse ex-aluno é bem-vindo para voltar a praticar. Afinal, o Karate é para a vida inteira. Ele só não pode voltar ao dojo ostentando a faixa-preta com se não tivesse ficado cinco, dez ou vinte anos parado. Se você desce a montanha, terá que subir novamente, por mais que já saiba o caminho. É preciso retornar com humildade de recomeçar e reconquistar a confiança e responsabilidade que é usar a faixa-preta. Carregar o nome de uma escola é coisa séria e deve ser tratada com a devida seriedade.
A faixa-preta não deve importar na forma como você como trata os demais, pois a tônica é sempre o respeito. Olhar para os alunos de cima, se achando bom demais para treinar com eles, ou então achar que não tem nada a aprender com um karateka de dan ou kyu inferior são coisas que demonstram apenas que, apesar da faixa, o praticante não entendeu a essência do Karate.
A faixa deve importar na forma como você se aplica no estudo da nossa arte e o quanto, a cada degrau que você sobe, entende que há muito mais a aprender. Ela é, sim, um símbolo de que seu sensei confiou em você para andar com as próprias pernas e ajudar a carregar o legado do Karate, que vem de muito longe no tempo. É treinar “com sinceridade no coração”, como dizia nosso mestre Tsunioshi Tanaka.
A faixa-preta é um marco de renovação da prática, quando já temos o básico e devemos treiná-lo para tornar avançado. É também uma responsabilidade a ser honrada, pela nossa escola, por nós mesmos e pelos karatekas que vieram antes de nós. Por isso, colocar uma faixa-preta em volta da cintura exige consciência. É preciso saber que antes do status o mais importante é a atitude.